O FENÔMENO PROFÉTICO


A Ciência tenta explicar
a percepção extrasensorial.

As críticas contra a linguagem profética.


90. A Percepção Extrasensorial (ESP)

            Lembro-me muito bem de certa noite do ano letivo de 1986 (última passagem do cometa de Halley, cheguei até a passar por dificuldades para adquirir um pequeno telescópio). Nessa noite, a aula na universidade era de Geometria Analítica e Álgebra Linear, o quadro-negro estava lotado de equações derivadas e integrais para responder ao problema proposto: quantas dimensões existem? – Depois de três horas de formalismo matemático, chegamos à resposta teórica mais simples possível: “n”. Ora, em matemática o “n” quer dizer qualquer número imaginável, no caso, maior que zero e inteiro. Hoje, os físicos vislumbram de 9 a 11 dessas dimensões e nós, em nosso mundinho cúbico e euclidiano, nos acostumamos a viver com apenas três delas: extensão, profundidade e altura. E é desta maneira que boa parte das almas vê o mundo. Galileu Galilei (1564-1642), Isaac Newton (1643-1727) e todos os viventes que vieram depois deles até o início do século passado estavam presos nesta gaiola tridimensional do geômetra Euclides (360-295 a.C), que explicava com certa racionalidade e satisfatoriamente o mundo. Todas as verdades cabiam neste sistema espacial e por ele eram explicadas.
            Felizmente, o espírito do homem não aceita verdades eternas, duvidou da verdade do quinto postulado de Euclides, aquele das retas paralelas, e elaborou as geometrias não euclidianas, ponto de partida para Albert Einstein (1879-1955) desenvolver suas modernas teorias. A partir de Einstein ficamos sabendo que a matéria não passa de energia condensada e que o espaço tinha mais um companheiro, o tempo. Uma enorme mudança no nosso modo de ver o mundo, porque teríamos que aceitar coisas como o limite da velocidade da luz, o Universo curvo e paradoxos dos mais diversos, como o dos gêmeos, em que um deles, numa suposta viagem espacial, com velocidade bem próxima a da luz, simplesmente retornaria ao planeta mais novo do que o gêmeo que aqui ficou.
            É evidente, que grande número de pessoas não consegue conjugar essa nova dimensão dentro do seu mundo conhecido e isso nos parece muito natural. Nesses não mais de 10 mil anos de processo de aquisição de conhecimento, em que desenvolvemos a escrita e deixamos de polir pedra para trabalhar com a eletrônica, somente na última centena de anos é que passamos a “treinar” para a percepção das quatro dimensões. Por milhares de anos, tudo em nós tem funcionado para o mundo cúbico. Nossos sentidos, por treino de gerações, só percebem a realidade objetiva tridimensional do instante a ser processado em nosso cérebro. Depois, o cérebro organiza essas percepções sensoriais, separa o que lhe parece útil, e as guarda naquilo que chamamos memória, que nada mais é do que um arquivo de instantâneos perceptivos não lineares, prontos para serem evocados a qualquer tempo. Ou seja, nosso treino nos ensinou a lidar relativamente bem com o que passou e com o que acontece no presente, porém ainda não nos ensinou a perceber o futuro, um dos componentes do tempo.
            Ainda não compreendemos o tempo em todas as suas possibilidades, assim como o homem primitivo não compreendia as causas do raio e do trovão, somente seus efeitos geralmente nocivos para ele. Heródoto nos conta que havia um povo que atirava lanças contra as manifestações desses fenômenos meteorológicos, na vã tentativa de afastar deuses que os provocavam. E assim se dá por toda nossa história, tudo aquilo que não conseguimos entender é imediatamente encaminhado ao departamento do sobrenatural para ser alvejado pelas lanças do preconceito e incompreensão, para não dizer ignorância mesmo.
            É de se imaginar como seria o mundo de hoje, se algum feiticeiro, ao ver o fogo, tivesse dito aos de sua aldeia que era preciso explicá-lo para depois usá-lo. Certamente, ainda estaríamos polindo pedras em nossas cavernas sem saber que ali, numa inútil e proibida fogueira, tínhamos uma simples reação química combinando carbono com oxigênio. E é dessa forma que estamos lidando com os fenômenos premonitórios, desejamos uma explicação de causa e ignoramos seus efeitos e benefícios. Algo explicável até certo ponto, porque a Ciência ainda se prende ao cartesianismo causal, ao determinismo matemático e que, creio, deixaram esse mundo há muito tempo.
            É sabido que utilizamos não mais do que a vigésima parte da capacidade cerebral, assim como é sabido que a natureza não costuma deixar espaços em branco nos organismos que se desenvolvem sobre o nosso planeta. No estudo da Evolução, verificamos que órgãos sem função ou utilidade são sacados dos organismos vivos. Então, é de se pensar a que, e para que, serve este grande vazio em nossos cérebros. Ora, o raciocínio em resposta nos parece lógico, já que utilizamos uma pequena parte dele na percepção do mundo tridimensional, o restante estaria disponível para diversas funções para as quais ainda não temos o entendimento perfeito, as outras dimensões, por exemplo, ou as chamadas Percepções Extrassensoriais (ESP), do inglês Extrasensory Perception. Novamente apelo para o raciocínio lógico, quando aprendemos a falar e a escrever, o cérebro já estava preparado para isso, de tal sorte que, quando aprendermos a estabelecer contato com outras dimensões, o cérebro também estará preparado para tal.
            Recentemente, a comunidade científica torceu o nariz para as pesquisas do renomado psicólogo e físico Daryl J. Bem (1938-) publicadas no Journal of Personality and Social Psychology e que aqui no Brasil mereceu matéria e chamada da capa da revista semanal “Isto-É”. Em sua pesquisa, Daryl relata nove experimentos feitos com mais de mil universitários e que comprovariam a existência do fenômeno ESP.
            “Segundo Bem, em oito dos nove experimentos houve um índice de acerto acima do que é considerado coincidência ou obra do acaso. Também foi feito um teste no qual o aluno escolhia se queria arriscar mais nas respostas ou se desistia de tentar. ‘Os que aceitaram correr mais riscos foram os que tiveram mais acertos’, conta Bem. O psicólogo é cuidadoso ao tirar suas conclusões, mas acredita que todo mundo pode ter capacidades precognitivas, embora uns as tenham mais desenvolvidas do que outros. Também explica que as percepções extrassensoriais são frutos do processo evolutivo no qual antever situações de perigo ou propícias à reprodução se tornaram vantajosas ferramentas de sobrevivência. Isso ajudaria a comprovar a existência de premonições.” [Isto-É, 9/03/2011].
            Como disse anteriormente, a sociedade científica ficou atônita diante das conclusões de Daryl J. Bem. Os questionamentos são vários: o método de aferição dos resultados; os instrumentos utilizados etc. Na realidade, os detratores de Daryl não se contentam somente em ver a ferida nas mãos do crucificado, eles desejam tocá-las. É como se um médico nos dissesse que estamos com febre e que ela existe de fato, mas o culpado pela febre seria o termômetro por estar mal ajustado e não a doença.
            Aqui, neste livro, fico satisfeito em apenas ver de longe a ferida, sem querer por meus dedos nela. Para que bem me entendam, contento-me somente em aquentar-me ao lado da fogueira sem querer explicá-la. Dedico-me, portanto, aos efeitos e não às causas e deixarei aos que a isso não compreenderem, a liberdade de arremessarem suas lanças no raio e no trovão que os incomodam.
            Em carta a seu filho César, Nostradamus nos conta como ele entendia o fenômeno ESP: “Profeta, propriamente falando, meu filho, é aquele que vê as coisas distantes através do conhecimento natural de todas as criaturas. E pode acontecer que o profeta, usando a luz perfeita da profecia, faça aparecer, de modo manifesto, coisas divinas e humanas, porque não pode ser de outro modo, uma vez que o efeito das predições se estende através do tempo”. (Fontbrune, p.30].
            Tempo, esta é a chave para começar a entender os fenômenos premonitórios. Tempo, esta é a dimensão que ainda não entendemos em plenitude e em todas as suas possibilidades.


            É de se pensar que uma parte dos pretensamente sábios refuta o fenômeno premonitório porque de antemão essa parte já se deu por vencida na total incompreensão do tempo. Esses pobres e infelizes de espírito são capazes de aceitar com uma fé cega e resignação bovina as possibilidades científicas da viagem no tempo – para o passado e para o futuro – e igualmente, com a mesma facilidade, fé e resignação, são incapazes de entender a intuição que lhes chegam todos os dias depois de uma boa noite de sono.


91. As críticas à linguagem profética

            Nas quadras examinadas neste livro, é limpa e transparente a visão de Nostradamus ao descrever batalhas e bombardeios num cenário quase sempre urbano. A guerra nas profecias aparece na destruição das cidades – uma infeliz tendência nos conflitos modernos – agora, não mais em campos de batalhas definidos e ou em longos cercos a castelos e burgos fortificados, como se fazia na época em que viveu o profeta. A guerra moderna é feroz e destrói populações inteiras em poucos segundos.
            Nas profecias, as visões de Nostradamus cabem muito bem no novo conceito de guerra “sem sujar as mãos de sangue”. Guerras em que se usam armas de destruição em massa, atômicas, biológicas ou químicas. É o pecado sem rosto, estatístico, que fará o sono dos assassinos mais tranquilo, sem as assombrações dos olhos de suas vítimas a espreitá-los na insônia provocada pelos demônios da culpa.
            Os detratores de Nostradamus e por fim, do fenômeno profético ou de premonição, têm o costume de desferir ataques à linguagem imprecisa que os profetas utilizam na descrição dos artefatos bélicos. O mais notável deles foi Voltaire (1694-1778), homem de gênio, com um orgulho intelectual maior do que a sua franzina pessoa e que desdenhou da fé até o dia em que se viu em seu leito de morte e pediu a clemência dos céus.
            Voltaire no uso da jovem Filosofia, desprovida do conceito moderno de tempo e limitada ainda por parâmetros imperfeitos da Ciência nos seus primeiros passos, assim falava acerca da linguagem dos profetas: “Mas é difícil adivinhar ao certo se por Jerusalém os profetas entendem sempre a vida eterna; se Babilônia significa Londres ou Paris; se, quando falam de um grande banquete, devemos interpretá-lo como um jejum; se vinho tinto significa sangue; se um manto vermelho significa a fé e um manto branco, a caridade. A compreensão dos profetas tem tudo a ver com o esforço do espírito humano. É por isso que não vou dizer mais nada a respeito”. [Voltaire, p.432].
            O deboche, feito no conhecimento limitado pela época em que se vive, esgota-se por si mesmo, e é por isso que Voltaire diz que não vai dizer mais nada a respeito dos profetas e profecias, porque ele não tinha mais elementos para continuar com a bazófia, reduto da vaidade dos que desconhecem os limites dos progressos científicos de sua época. Maroto e firme no propósito de atingir principalmente os profetas, judeus e católicos, a religião em si, Voltaire finge esquecer que a linguagem humana sempre se valeu de alegorias e comparações em todos os ramos de conhecimento. O filósofo poderia ter feito ciência e preferiu o caminho mais fácil, o ridículo de si mesmo. E quantos até hoje não seguem os mesmos passos de Voltaire? Quantos ainda hoje se deixam arrastar pelos falsos dogmas científicos, numa religiosidade e fé maiores do que se tinha na Idade das Trevas? Quantos cientistas deixam de fazer as pesquisas necessárias nesse campo do conhecimento humano simplesmente do medo que têm de ver suas “reputações” abaladas? – a Ciência existe para quebrar dogmas e paradigmas. Caso assim não fosse, Einstein passaria a sua vida toda trabalhando num escritório de patentes, com medo de apresentar ao mundo elementos questionadores de todas as verdades de Newton. Heisemberg (1901-1976) se entregaria ao ostracismo, encolhido no seu canto ao ter que dar caráter dual ao elétron, quebrando a mais sólida lei da Ciência até aquele momento, que era a total ausência da dúvida numa medida física.
            O que quero dizer é que Nostradamus utiliza-se dos efeitos de um fenômeno sem, no entanto, conhecer quaisquer formulações teóricas sobre ele – se hoje pouco sabemos, imaginem como eram as coisas no século XVI. E mais, Nostradamus não foge às regras da linguagem profética e de forma comum aparecem em seus versos alegorias envolvendo lanças, espadas, fenômenos meteorológicos, como chuva, trovão, granizo etc. Tudo para descrever combates, carnificinas e desastres naturais – veterano artifício dos oráculos e que remonta aos profetas bíblicos e que é de uso corrente desde as mais primitivas religiões.
            Portanto, pelo o que foi estudado, verifica-se que, no fenômeno profético, a linguagem é um meio e não um fim. Ela tem que chegar pronta para ser decodificada aos ouvidos das pessoas por meio de comparações ao que é comum a todos num tempo específico. Imaginemos uma situação hipotética como, por exemplo, se no século XVI, quando as Centúrias foram publicadas, Nostradamus tivesse mandado imprimir: “O presidente dos EUA mandou bombardear o inimigo com mísseis guiados por GPS”. Muito provavelmente nem mesmo o profeta saberia decodificar sua inovadora linguagem: a palavra “míssil” não existia e a ideia de tal foguete não fora concebida ainda. Para ele, somente seria possível descrever esses artefatos bélicos como algo parecido com lanças e que provocavam uma luz mais brilhante do que a do Sol, além de um estrago medonho.
            Continuemos nesse exercício de imaginação: e se, por um problema qualquer, um homem instruído, tivesse entrado em coma no início da Segunda Guerra e dele acordado somente dez anos depois. Esse homem teria um nome para designar uma bomba atômica? – Certamente que não. Ao vê-la, ele a compararia com algo que conhecera antes do coma, uma grande granada de artilharia, por exemplo.
            É sabido que na metade do século XVI, as armas comuns aos guerreiros eram a lança, o arco, a besta e a espada. As armas de fogo em bronze fundido figuravam nas batalhas como novidade ainda: caras, imprecisas e feitas à mão por ferreiros e armeiros: primárias ao extremo. Distinguiam-se entre essas novidades: os “pedreiros”, peças de artilharias de grosso calibre que disparavam pelouros (bolas) de pedra; os “canhões” de baixo calibre que atiravam pelouros de ferro; e as “colubrinas”, também com pelouros de ferro e que alcançavam distâncias maiores em relação aos outros armamentos.
            Em Portugal, a grande potência dos mares na época, as bombas foram chamadas de “panelas de fogo” – simples utensílios de barro, usados normalmente para cozinhar, eram preenchidos de pólvora e, depois, arremessados contra o inimigo. Nada que se compare com os modernos armamentos de última tecnologia que temos agora. A coisa mais parecida com um fuzil era uma espingarda tosca, que maior estrago fazia ao atirador do que ao alvo. Os ferreiros ainda não dominavam técnicas de fabricação de bons canos de metal e culatras que normalmente explodiam no rosto do soldado. Nunca a expressão “o tiro saiu pela culatra” foi tão usada e com tanta propriedade!
            Nas Centúrias também observamos a ausência de citações atribuídas a outrem ou a transcrição de diálogos, o que nos faz pensar que as visões de Nostradamus se faziam semelhantes ao que vemos num filme mudo. Ele havia desenvolvido a capacidade de ver o futuro, mas não a de ouvir as pessoas no futuro. Neste caso, e definitivamente, seria quase impossível ao profeta saber o nome daquilo que estava observando; a comparação de objetos do futuro com os objetos de seu tempo seria seu único recurso de linguagem descritiva.
            Outra crítica que se faz a Nostradamus, e isso como médico, é que ele foi incapaz de reproduzir os progressos da medicina e farmacologia em sua época. Sabemos apenas, e superficialmente, que Nostradamus era um iniciado em Alquimia, algo muito natural para um médico do século XVI. O ofício de curar exigia de quem praticava a Medicina a manipulação dos medicamentos ministrados aos pacientes. Nos poucos registros confiáveis de Nostradamus como médico, há notícias de que ele desenvolveu um método eficaz para tratar os adoecidos pela peste, logo após sua própria família ser vítima dessa doença. Há também relatos que ele teria desenvolvido métodos higiênicos para a preservação de alimentos em conserva.
            Com a Inquisição rondando as ruas, os alquimistas geralmente trabalhavam sozinhos, com códigos próprios para o registro de suas descobertas e métodos. As substâncias químicas eram manipuladas, porém a maioria dos nomes dessas substâncias não pertence à nomenclatura que os químicos usam nos laboratórios modernos. Na inglória busca pela pedra filosofal – substância mágica que teria a propriedade de transformar qualquer coisa em ouro –, ou da panacéia – remédio que curaria todos os males humanos –, ou ainda do elixir da juventude, os alquimistas denominavam o ácido etanóico, nosso vinagre, de acetum (azedo) e o etanol, álcool etílico, de “espírito do vinho”. A mistura de ácido muriático (“espírito do sal”, por ser obtido a partir do sal de cozinha) com o ácido nítrico (aqua fortis), na proporção de um para três, tinha o nome de Água Régia – a “água real” que magicamente conseguia fazer o que outros ácidos não faziam: atacar e dissolver o ouro:
            “Surgiram os alquimistas que os escritores modernos tão facilmente desprezam, mas que foram os primeiros pesquisadores de nossa época. Achavam-se em contato íntimo com os fabricantes de vidro e artistas de metal e com os herboristas e curandeiros do tempo; investigavam e pesquisavam muitos segredos da natureza. Mas viviam obsedados por idéias ‘praticas’. (...) E perderam-se nesses e noutros sonhos vulgares semelhantes. Em suas investigações, incidentemente, aprenderam contudo muito a respeito de venenos, tintas, metalurgia e coisas desse gênero; descobriram várias substância refratoras e conseguiram o vidro claro e, deste modo, lentes e instrumentos óticos. (...) Estreitamente associados com os alquimistas vinham os astrólogos, estudiosos também da mesma ‘raça’ prática. Estudavam as estrelas – para ler a sorte e descobrir o destino.” [Wells, pp. 556, 557; 2V.].
            Os métodos alquímicos de obtenção de substâncias beiravam ao bizarro, na queima de vísceras e ossos de animais, na maceração e redução de vegetais a cinzas, ou esmagamento de minerais; a terra e a pedra passavam pelo almofariz antes do uso nas formulações, quase todas secretas. Os instrumentos de pesquisa também eram curiosos, geralmente desenvolvidos pelo próprio alquimista. Entre eles, a de maior tecnologia era a retorta de destilação muito semelhante aos alambiques de cobre ou latão que podemos ver atualmente em fábricas artesanais de aguardentes e outra bebidas destiladas. Então, nos parece também impossível para um homem do século XVI, mesmo que excepcionalmente educado como Nostradamus, que cursara a universidade, "copiar" algum processo moderno de fabricação de medicamentos, mesmo o mais simples dos analgésicos que compramos na esquina de nossa rua para curar uma dor de cabeça ou para nos livrar dos inconvenientes de um simples resfriado.
            No tempo da escuridão, outra forma de registro que Nostradamus poderia ter lançado mão para descrever suas visões seria o desenho ou esboços. Não sabemos de seu talento para esta arte e nunca vamos saber. Ele mesmo confessou que ateou fogo a vários códices e possivelmente suas anotações e segredos foram juntos com a mesma fumaça.
            Agora, resta-nos apenas reforçar mais um argumento quanto à linguagem utilizada pelo oráculo francês. Felizmente temos a poesia que nos oferece infinitas possibilidades figuradas para descrever aquilo que normalmente a linguagem em prosa não alcança. Nostradamus sabia disso! – e como sabia! – A descrição, por exemplo, das revoltas no Egito e de resto no Norte da África, como colocadas nas quadras estudadas, hoje serviria como texto de fundo para uma reportagem de TV, tal a exatidão e riqueza de detalhes nela contidas.

92. Os profetas do “fim do mundo”

            Todos os vaticínios, até mesmo os bíblicos, apontam para um longo período de sofrimento da humanidade e terminam anunciando um novo tempo de felicidade, em que não mais existiram aflições. O raciocínio é simples: para haver esse novo tempo, temos que renunciar às más práticas do tempo atual em que, definitivamente, nada conspira para a felicidade daqueles que, trôpegos, se arriscam neste grande vale da sombra da morte, permeado de sofrimento, ódio, guerras e injustiças. Portanto, há de se tomar cuidado com os “profetas” que fazem do fenômeno premonitório uma plataforma para interesses escusos e se utilizam da boa-fé dos crentes inclusive para conduzi-los a desatinos ou e até mesmo à morte.
            O caso mais conhecido e triste do mau uso das profecias bíblicas aconteceu em 1978, com o polêmico líder religioso norte-americano Jim Jones (1931-1978) que, usando e abusando do discurso apocalíptico, levou à morte por envenenamento 918 membros de sua comunidade religiosa, incluindo mais de 270 crianças. Cerca de 400 corpos não identificados foram enterrados em Oakland (Califórnia). Ele mesmo se suicidou, certamente sabendo de suas mentiras.
            As profecias são para a boa orientação dos que têm juízo e discernimento; dádivas de esperança aos que desejam um mundo melhor, um homem melhor, uma vida melhor. Qualquer outro uso que se faça das previsões do futuro que não seja para o bem pessoal ou da humanidade tem que ser visto como um sério desvio moral de quem a isso se propõe. Por isso, Nostradamus faz um alerta em latim para os mal intencionados que se aproxima de seus escritos:

LEGIS CANTIO CONTRA INEPTOS CRITICOS
Quos legent hosce versus mature censunto,
Profanum vulgus et inscium ne attrectato
Omnesq: Astrologi Blennis, Barbari procul sunto,
Qqui aliter faict, is rite, sacer esto.
[ORDEM DE ENCANTAMENTO CONTRA CRÍTICOS INEPTOS – Quem entender estes versos prontamente,/ Não é do vulgo profano e ignorante;/ Afastem-se os astrólogos ineptos e bárbaros,/ Que em outro incitamento este rito é sagrado!].

93. A caixa de Euclides

Compactuo contigo revoltas
Contra esse mundo cúbico
A nos limitar a criatividade,
A nos por freio à imaginação.

São dois mil e trezentos anos
Sobre os nossos pobres ombros
Que dizem de nossa infelicidade
Axiomática e tridimensional.

Três vezes maldito é Euclides
Que nos prendeu nessa caixa
Sem as medidas do espírito!

Ah, se tal geômetra fosse poeta,
Ele teria explicado a geometria
Nas dimensões de nossas almas!


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